quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Uma família refeita

Por Laís Mari Rabelo

Emília nasceu quando sua mãe Sabrina Silva tinha apenas 17 anos e ainda estudava. O pai não quis saber da criança e fugiu com outra mulher antes mesmo do nascimento da filha. Os dois não eram namorados, apenas haviam “ficado”, “termo utilizado pelos jovens para definir um relacionamento sem compromisso”, explica a assistente social Juliana Farias Goncho.

Com bastante esforço, Sabrina criou a criança com ajuda de seus pais. Assim como 20% das crianças que nascem no Brasil, Emília nasceu quando sua mãe era adolescente e solteira, segundo dados da Pesquisa Nacional em Demografia e Saúde realizada em 1996.

Quando Emília completou dois anos, a mãe resolveu sair com as amigas pela primeira vez depois da gravidez. Conheceu e começou a namorar Evandro. Estudado e com bom emprego, o homem de 30 anos estava disposto a assumir Emília e criá-la junto de Sabrina. Já durante o namoro cumpria funções de pai, levava para a creche e ao médico. “Ele fazia questão de vestir a roupa de Papai Noel no dia de natal, só para ver Emília feliz”, lembra Sabrina.

Tudo o que Evandro fazia realmente tocava o coração da mãe de Emília. Porém depois de 5 anos de namoro o verdadeiro pai da criança apareceu. Sabrina relutou em aceitar que Júlio Ferraz Nascimento teria direito de visitar a filha. Mas depois de alguns meses, o homem por quem a Sabrina havia se apaixonado quando adolescente parecia ter se arrependido.

A decisão de romper o namoro com Evandro veio em seguida. Emília, então com sete anos e apegada ao padrasto, adoeceu. “Crianças sentem muito a falta da figura pai e mãe, muitos demonstram seu estado emocional com mudanças físicas de saúde, como febre e problemas estomacais”, ressalta a psicóloga Karla Rabelo.

A possibilidade de ver seus pais juntos novamente garantiu a melhora da menina. E em apenas seis meses Sabrina e Júlio casaram. Tiveram mais um filho, Artur. “Quero curtir toda a infância dele, já que não estive presente enquanto Emília era bebê”, conta Júlio.

Esta é uma história com final feliz, Sabrina diz que Emília está muito melhor agora. Na escola as notas melhoraram, a professora Marizabel Silvestre garante que depois que o pai voltou, a menina é outra. “Ela está desinibida e mais segura. Com certeza isso faz diferença para a auto-estima da criança”.

Aos 11 anos Emília brinca com Tony, o vira-latas que estava na rua e conquistou a menina ao ponto de querer criá-lo. Enquanto isso a avó da menina Milene Silva lembra como foi difícil o começo. “A nossa situação financeira não era ruim, mas queríamos garantir os estudos dos filhos”. Milene e o marido eram os donos da loja de roupas do bairro. Viajam para São Paulo todos os meses para buscar mercadorias. Era da loja que tiravam o sustento dos quatro filhos. Tinham carro, e casa própria. Os filhos estudavam, porém o dinheiro não era suficiente. E para cursar a faculdade, Sabrina teria que procurar um emprego.

O nascimento de Emília fez a rotina da família toda mudar. Para que Sabrina pudesse ao menos terminar o segundo grau, seu irmão mais velho trancou o curso de Administração durante um semestre para poder ficar com a menina enquanto a mãe estava no colégio. Já Milene precisou adiar a reforma da cozinha para comprar o enxoval da neta. “Mas conseguimos, somos uma família unida até hoje e Emília nos trouxe várias alegrias”.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Herdeiros do futuro: história de um pequeno sonhador

Por: Laís Clemes

Sonhar e desejar movem o ser humano a buscar um ideal, algo que lhe traga prazer, bem estar e qualidade de vida. Assim como muitos dos milhares de cidadãos brasileiros, as crianças anseiam o mesmo desejo: ser feliz e buscar algum objetivo na vida.

Segundo o artigo quatro do Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, “é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.

Porém, vivemos num país com grande índice de desigualdade social. Segundo dados do UNICEF de 2008, cerca de 78% das crianças pobres estão em risco social. Destas, 14% não frequentam a escola.

João Silva, 11 anos, é uma dessas crianças. Desde pequeno trabalha para ajudar os pais na roça. Trocou cedo a brincadeira pela enxada, a relação com as crianças pelo trabalho diário. Apesar da pouca idade, o pequeno sabe muito bem o que quer: “quando eu crescer, quero ser alguém rico, não para ter muito, mas para poder dar muito aos outros”, diz a criança.

As marcas de sua infância foram desenhadas por uma rotina dura de trabalho. Porém, para ele, a melhor recompensa é poder ajudar a família. Mais velho de seis irmãos, João toma as responsabilidades da casa, não liga ter que acordar cedo para ajudar os pais.

O presidente do Conselho Tutelar de Tubarão, Fernando Fernandes Antunes, diz que exploração do trabalho infantil não é responsável pelo maior número de casos com a intervenção do conselho. Mas salienta que esse é um dos casos mais complicados de se comprovar. “Muitos dos jovens que trabalham não estão ali forçados, mas sim por que querem ajudar a família e ter o seu próprio dinheiro”, explica o presidente. “Já tive caso de o menor fugir do lugar onde trabalhava para não ser impedido de trabalhar”, completa.

O Conselho Tutelar de Araranguá, com base no artigo quatro do ECA, há seis meses encaminhou o menino para a escola, a família, por não ter nenhum grau de instrução, não foi punida e nem julgada pelo crime de exploração infantil. João não pode mais ajudar os pais na roça. “Não sei por que fizeram isso, mas eu gostava. Aprendi com meus pais a dar valor às pequenas coisas, o que talvez não aprendesse na escola”, diz João.

Hoje João frequenta a escola pela manhã e à tarde, o conselho tutelar encaminha a criança para um projeto de socialização, como a Instituição Casa da Fraternidade em Araranguá, que há mais de duas décadas promove atividades que visam resgatar crianças marginalizadas socialmente. Histórias de risco social são recorrentes na casa. Hoje o projeto auxilia 112 crianças e adolescentes, por meio da arte e educação.

Na casa que frequenta, o menino não vê diferença entre ele e as outras crianças. A presidente da Casa da Fraternidade, Cátia Hahn, explica que o projeto para ter um bom resultado não pode trabalhar apenas com crianças em risco social, mas também deve lidar com menores que buscam apenas uma atividade. “Não separamos as crianças, pois não existe socialização se você separa as pessoas. Nós convivemos com as diferenças e elas que nos fazem crescer”.

Nesse ambiente, João esquece um pouco das responsabilidades que carregou durante anos nas costas. Ele faz diversas atividades: música, canto e aula de reforço. “Sem música a vida seria um erro”, já dizia o filósofo alemão Nietzsche. É ela que faz o menino sonhar. As letras das músicas mostram um mundo colorido que João até então não conhecia. “A música tem o poder de transformar, transpor os sentimentos, dar a sensação de viver algo que não é tangível”, explica o professor de música Renato Ronconi. Nos corredores da instituição que frequenta, João canta, ri brinca com os colegas. Sua roupa mais surrada seu andar tímido não são motivos para que ele deixe de sorrir e de sonhar. “Um dia serei advogado”, diz o menino.

(* O nome do menor apresentado na matéria é fictício)

A situação do orfanato

Por Eliana Maccari

Um bebê, duas crianças e dois adolescentes. Estes são os menores de idade que se encontram no orfanato Paraíso da Criança, em Urussanga. Em outros tempos, o abrigo já chegou a ter mais de 100 menores de idade. Hoje, com a nova Lei Nacional de Adoção, as normas judiciais são outras.

Segundo o presidente do Conselho Tutelar de Tubarão, Fernando Fernandes Antunes, o menor só chega ao abrigo após o encaminhamento do conselho. Casos de desestruturação familiar e de abandono são as maiores causas para a retirada do menor do lar. O conselho tenta todas as possibilidades para a criança manter o vínculo familiar, ainda que seja com parentes próximos ou distantes. Não obtendo êxito, o menor é encaminhado ao orfanato. Antunes ressalta que muitas crianças, mesmo em situação de risco, desejam estar junto com os pais.

“O pai pode beber, a mãe pode bater, se prostituir. Por pior que seja o pai e a mãe, as crianças querem estar com eles”, revela a psicóloga do orfanato Paraíso da Criança, Rosimere Meneghel.

A chegada ao abrigo é um dos momentos mais difíceis para o menor de idade. A maioria deles não entende o que está acontecendo. Rosimere explica que o estado emocional é bem afetado, havendo muito sofrimento. As reações, ao entrar no orfanato, vão desde angústia até rebeldia, demonstradas em pequenos gestos do dia a dia.

Um caso recente de rebeldia, citado por Rosimere, é de B. M., 8 anos. O menino está há três meses no abrigo, junto com a irmã L. M., 12 anos. Ele não estuda e não se dedica na escola. A psicóloga revela que constantemente ele diz que não vai melhorar enquanto não voltar para a casa dele. A questão do futuro é trabalhada pela psicóloga no orfanato, mas o tema é complicado, pois Rosimere sabe que o futuro deles é incerto. “Prepará-los para quê”, questiona ela.

Uma das mudanças na nova Lei Nacional de Adoção é sobre a permanência no abrigo. Antes não havia prazo. Hoje a criança pode ser mantida por no máximo dois anos e seu caso reavaliado a cada seis meses. Essa é uma decisão que muda o psicológico dos menores que passam pelo orfanato. No entanto, o preconceito é outra barreira. Segundo Rosimere, os menores têm vergonha de contar que moram no abrigo já que são alvo de piadas na escola. Geralmente recebem o apelido de “sem teto” dos colegas.

A zeladora do orfanato, Terezinha Camola, afirma que os menores rejeitam o abrigo porque não há autorização para eles saírem do local. O contato com o mundo fora do orfanato acontece somente quando as crianças estão na escola. Nos finais de semana parentes só podem passear com o menor mediante autorização do juiz.

A responsabilidade da adoção

Por Catarina Ko Freitag


Muitas vezes, ter um filho não é tão fácil assim. A maioria dos pais que querem uma criança são estéreis, têm problemas de saúde, ou já tiveram vários abortos. A solução é a adoção. Adotar uma criança é uma responsabilidade para o resto da vida, os pais devem estar muito cientes deste ato. Os pais têm que levar em consideração que a adoção deve resolver o problema de uma criança, que é o de encontrar uma família, e não para segurar as brigas de um casal. Aceitar a adoção de uma criança é uma tarefa difícil, principalmente para a mãe, pois durante a gravidez há todo um processo de reconhecimento da maternidade da mãe, ver a barriga crescendo, sentir um filho dentro dela. É uma sensação única. Porém o mais importante é dar amor, educação e carinho à uma criança, seja ela biológica ou não. Mariana de Souza, hoje é uma moça, trabalha, faz faculdade, tem tudo o que sempre sonhou, se ela não tivesse sido adotada há 19 anos, talvez nem existisse mais.

No Brasil a demora no processo de adoção é uma das principais causas de desistência nas filas. As etapas do processo são muito burocráticas, e em média as pessoas ficam mais de dois anos na fila de espera. Se por um lado há os pais que querem adotar um filho, existem outros que querem se livrar dos seus. Pais inconseqüentes geram os filhos, mas não dão os cuidados necessários que uma criança precisa. Nestes casos, entra em cena o conselho tutelar de cada cidade. É papel do conselho zelar pelo bem estar físico e psicológico da criança e do adolescente. Cabe-lhe fiscalizar denúncias de maus tratos, exploração sexual, pressão psicológica, trabalho infantil, negligência e abandono. Segundo o presidente do Conselho Tutelar de Tubarao, Fernando Fernandes Antunes, existem várias formas de denunciar uma família à instituição. Pode ser procura espontânea, pela central de atendimento Disque 100, por apontadores que flagram crianças vítimas de maus tratos infrequência escolar.

No caso de Mariana, seus pais adotivos queriam muito um filho, porém sua mãe era sangue O- e seu pai O+, dando problemas sanguíneos ao feto. Ela já tinha tido três abortos. “Minha mãe, que sempre foi muito católica, perguntava sempre à deus o que ela tinha feito de errado para não conseguir ter um filho”, lembra ela. Neste mesmo tempo, em uma comunidade vizinha, uma mãe alcoólatra, que já tinha dois filhos de pais diferentes, iria jogar seu terceiro filho, recém nascido, de uma ponte. “Ela estava muito alterada, dizia que não era para eu ter nascido, que tinha que terminar logo com aquilo”. Foi uma situação bem complicada.

O tio de Mariana, que já sabia que seu irmão queria muito um filho, tirou o bebê das mãos da mãe (que estava prestes à jogá-lo no rio) e o entregou ao seu irmão. Eles a adotaram com um mês de idade, a registraram como se fosse filha biológica, sem a papelada da adoção. Antunes admite que é muito comum que isto aconteça, porém adotar uma criança sem passar pelos processos adotivos é considerado crime. O fato é que Mariana teve uma família, e é muito amada e feliz. “eu tinha uma irmã biológica, mas ela não teve a mesma sorte que eu. Era dois anos mais velha, tinha cabelos loiros, olhos verdes, muito parecida comigo. Quando ela tinha 17 anos, morava em um abrigo no centro de Florianópolis, vivia sem a mãe há muito tempo, e era usuária de drogas. Uma noite ela foi atropelada, e o carro fugiu sem prestar socorro”, revela. Segundo Antunes, se o conselho estivesse presente naquela época, os dois filhos seriam tirados da mãe, por negligência, e seriam levados à algum orfanato.

“Não há nada mais gratificante para alguém do que ser chamado de mãe ou pai. É uma grande responsabilidade que adquire ao longo da vida. Filhos são uma dádiva de deus, e deve-se amá-lo ao extremo, não importando se são biológicos ou adotados, o que importa é a educação e o amor dado a eles. Lembre-se que para se adotar uma criança é preciso ter muita paciência, e não ‘escolha’ a criança, tente se imaginar primeiro no lugar delas”, relata a mãe adotiva de Mariana.

Entidade Nossa Casa faz a diferença

Por Emile Borges

Crianças que sofreram maus tratos, abuso sexual, com problemas na família, adolescentes que estão em situação de risco. É assim que chegam até a Nossa Casa, na cidade de Criciúma.

Felipe chegou na entidade há um mês, por sofrer maus tratos do seu padrasto. Hoje o menino passa por um acompanhamento com a psicóloga da casa, pois é uma criança com traumas, “ele fica com muito medo, é assustado e precisa de cuidados especiais” diz a psicóloga da casa Renata Cardoso.

Já os irmãos, João, Larissa e Lucas estão na entidade há algum tempo, porque a família está passando por sérios problemas. Atualmente a entidade está abrigando doze crianças, elas ficam em tempo integral, algumas vão a escola e depois retornam.

A entidade beneficente nossa casa é uma entidade não governamental, sem fins lucrativos que desenvolve um trabalho diferenciado na região. A casa atende crianças de adolescentes de 0 a 18 anos, meninas e meninos que podem estar em situação de risco social e familiar.

É através do Conselho Tutelar ou ordem judicial que as crianças chegam até o abrigo e ficam ali por tempo indeterminado, até que mediante determinação judicial são recolocadas na família ou em família substituta. As crianças que estão na entidade passam por um acompanhamento com a assistente social Simone Souza. “Nós fizemos um relatório de cada criança e da sua família, enquanto elas estão na entidade e quando voltam , é feito uma preparação para que a família possa receber a criança novamente” .

Há crianças que ficam na entidade para a adoção, como é o caso do bebê Gabriel de oito messes. A futura família esta passando por uma avaliação para recebe- ló em casa. Essas famílias são encaminhadas através do Fórum onde preencheram um questionário para a adoção.

A entidade conta com quinze funcionários que trabalham em dois turnos, para um melhor atendimento as crianças. Sandra Machado trabalha na casa há quatro anos e nos relata: “Aqui é a minha segunda casa, essas crianças são como se fossem meus filhos , quando eles saem daqui, bate um aperto no coração. Fizemos de tudo para que as crianças sintam-se em casa. Elas acordam tomam um café delicioso, umas vão para e escola outras ficam na entidade, fizemos brincadeiras, contamos histórias . A nossa alegria é ver o sorriso estampado nas expressões das crianças”

Segundo a coordenadora da Entidade Nossa Casa, Maria Carmen Búrigo, o maior objetivo da casa é fazer com que as crianças e adolescentes que ali estão, possam ter uma formação social para serem inseridos na sociedade .

A casa mantém-se através de doações. As principais dificuldades são a falta de fraudas, leite e utensílios de limpeza. A Nossa Casa está aberta para visitação das pessoas todos os finas de semana das 14:30 às 16:30 horas.


*Os nomes das crianças contidas na matéria são fictícios.

Uma Vida Perdida

Por Angelica Brunatto

A droga está cada vez mais presente na nossa sociedade. Ela destroi laços familiares e a vida da pessoa. Deixa uma família desestruturada. Por causa dela é grande o número de pais que não dá valor aos filhos, que os agridem e às vezes até os abandonam.

De acordo com o presidente do Conselho Tutelar de Tubarão, Fernando Fernandes Antunes, “a droga pode trazer conseqüências graves para a família. Além de destruir os laços, quando usada na gravidez traz riscos à saúde do bebê”. Ele ainda complementa que pais drogados negligenciam as crianças.

As drogas levaram os pais de uma criança a abandoná-la em uma loja em Tubarão. O casal estava na cidade há poucos dias e o bebê era recém nascido. Junto aos pertences da criança, foram encontradas drogas. Os pais foram presos e a criança encaminhada a uma família provisória.

Boa vontade e determinação são os ingredientes necessários para a recuperação de uma pessoa dependente das drogas. Um exemplo, para mostrar essa realidade, é o do Desafio Jovem, localizado na cidade de Tubarão. O local começou a funcionar em 1991, quando o fundador, Sandro Guerreiros, voltou de um lugar semelhante na cidade de Criciúma. Na época, com 17 anos, ele decidiu procurar ajuda. Como conta o coordenador do Desafio Jovem, Fábio Machado de Medeiros, Sandro procurou ajuda sozinho. “Ele foi à Criciúma a pé para procurar tratamento”, revela. Hoje o homem tem 38 anos de idade.

O tratamento desenvolvido funcionou, Sandro decidiu abrir uma casa para abrigar pessoas com dependência química em Tubarão. No local, uma série de atividades envolve esses internos, que devem permanecer na casa por pelo menos nove meses. Entretanto, para que o tratamento funcione, é preciso que o dependente queira melhorar. “A pessoa precisa querer ajuda para que o trabalho possa ser feito”. Enquanto estão no Desafio Jovem, os internos devem cuidar do local onde vivem. Uma das tarefas propostas pelos membros do Desafio é fazer os moradores trabalharem para poder viver.

Durante o tempo em que permanecem na casa, os internos participam de reuniões, que cuidam da parte da espiritualidade, conscientização, e também oferece conselhos aos dependentes. Essas reuniões acontecem três vezes ao dia. Os aconselhamentos são feitos por psicólogos, que fazem também um acompanhamento individual.

INTERNOS

Nos primeiros anos de existência, o Desafio Jovem trabalhava com 80 internos. Hoje vivem 28. Entretanto a capacidade da casa é de 20 dependentes. Eles têm o direito de desistir do tratamento em qualquer etapa. “Basta eles se sentirem prontos para isso”, revela Fábio.

O Desafio atente pessoas das mais diferentes idades. Atualmente a faixa etária está entre 17 e 50 anos. Grande parte delas são reincidentes. Pararam o tratamento, e voltaram a conviver com as drogas. Segundo o coordenador do local, “a droga acaba com a vida da pessoa”, que geralmente tem algum problema.

Ninguém que está sob tratamento tem autorização para sair da casa, a não ser que tenha que resolver algum problema urgente. Mesmo assim, deve ir acompanhado de algum funcionário do local.

As visitas também são restritas. O interno só recebe visita dos familiares a cada 15 dias, nos domingos. É apenas esse o contato que eles têm com a família.

UMA HISTÓRIA QUASE FELIZ

F.J é interno reincidente do Desafio Jovem. A primeira vez não chegou a completar o tratamento. Saiu da casa no sexto mês. Procurou ajuda aos 18 anos, sete anos depois de ter começado a fumar.

O cigarro abriu portas para que começasse a usar outras drogas, como a maconha, cocaína, tanto injetável quanto cheirada. F.J diz que já chegou a usar drogas mais fortes, como o crack e alguns medicamentos.

Na família de F.J já haviam outras pessoas que faziam uso dessas substâncias. Influenciado por primos, F.J começou a fumar. Tinha vontade e curiosidade para experimentar. “A gente só usa porque a gente quer, mas sempre acaba influenciado”, alerta.

Antes de entrar no Desafio, F.J já foi preso por assalto por causa da droga. Entretanto foi liberado pela juíza, que entendeu que ele queria mudar. Por iniciativa própria foi parar no Desafio Jovem. Na época, o rapaz tinha 18 anos e nos seis meses que permaneceu internado conseguiu uma recuperação.

“Depois que cheguei aqui minha vida mudou, eu não tinha mais vida”. Ao sair do Desafio Jovem ele começou a trabalhar e ter uma vida nova. Entretanto, após algum tempo voltou a usar drogas outra vez. Ele também era noivo há um ano, mas o vício acabou com o relacionamento.

A noiva desistiu do casamento por medo de ele não parar mais. E então F.J voltou para o Desafio para tentar acabar com a dependência. Agora ele garante que vai cumprir os nove meses de tratamento.

Hoje F.J tem 23 anos, perdeu uma adolescência por causa da droga. Agora, reconsquista tudo o que perdeu, inclusive a noiva. Recebe visitas na casa somente da mãe e da irmã, e garante que o relacionamento com a família mudou. Um dos sonhos de F.J é poder construir a própria família.

Quando falta o amor


Por Lisiane Back

Abandono, descaso, maus tratos. Esses são os principais casos atendidos pelo Conselho Tutelar. Histórias que impressionam e muitas vezes parecem não ser reais. Pais drogados, mães prostituídas e filhos deixados de lado. Crianças indefesas, passando fome, apanhando, sofrendo abuso sexual e sem receber carinho e atenção. Pequenos cidadãos sofrendo dentro das próprias casas, lugar que deveria ser o porto seguro de cada um.

O presidente do Conselho Tutelar de Tubarão, Fernando Fernandes Antunes, conta diversos casos que acompanhou no conselho. Muitos impressionam. Entre eles, a história da menina de 10 meses, com problemas sérios de coração e que a mãe se recusava a procurar atendimento médico.

Quando avisados do caso, procuraram imediatamente a família da criança. A mãe estava em casa com a menina. Antunes pediu para que a mãe arrumasse a coisas, que o conselho as levaria para Florianópolis, onde a menina receberia atendimento especializado. A mãe se recusou a levar a filha naquele momento. Então, foi avisada que na manhã seguinte seria obrigada a seguir com a menina para Florianópolis. Assim ocorreu, embora a mãe tenha resistido e seguido contra vontade. Após a consulta médica e informada quanto ao diagnóstico do bebê, ele foi imediatamente internado no hospital. O caso era grave. A mãe permaneceu com a criança no hospital por alguns dias e retornou para Tubarão, deixando a filha no hospital.

Tomando conhecimento do fato, Antunes tentou procurar pela mãe, mas não a encontrou mais. Situação delicada, descaso dos pais que abandonaram a criança no hospital. Depois de alguns dias, infelizmente o bebê veio a falecer. E a mãe estava desaparecida. Onde estava o sentimento materno? É difícil de compreender, diz Antunes.

Situações semelhantes acontecem todos os dias na sociedade. E o trabalho de profissionais como Fernando é de fundamental importância para auxiliar estas crianças, inocentes, indefesas, que estão à mercê de pais incapazes de dar carinho e atenção para um ser que tem o próprio sangue.

No município de São Ludgero, o Centro de Educação e Cidadania (CEC) garante atendimento a crianças e adolescentes que se encontram em situação de risco social. O projeto surgiu da iniciativa do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e atende crianças encaminhadas pelo Conselho Tutelar e pela Vara da Infância e Adolescência. As 75 crianças que permanecem no CEC, em período integral, são acompanhadas pelo conselho tutelar, psicóloga e professores.

Uma missão árdua, que requer dedicação. Mas também gratificante. Assim é o trabalho dos profissionais que atuam na instituição. Oferecer aos pequenos cidadãos melhores oportunidades é o principal objetivo do projeto. Aulas de música, dança, oficinas de artesanato, computação e demais atividades fazem parte do dia a dia das crianças. Segundo a professora Salete Venturiano, muitas das crianças, quando chegaram no CEC, tinham problemas com higiene, não se alimentavam direito e tinham dificuldade na escola. Mas com o passar do tempo, foram melhorando, e hoje são crianças que brincam, estudam e se divertem entre as demais.
“O resultado é muito positivo”, afirma Salete.

Profissionais como Antunes e os que atuam no CEC são apenas alguns exemplos de pessoas que se mobilizam para ajudar crianças e adolescentes. O trabalho de cada um deles é uma luta diária. “Uma luta em prol da sociedade e que só vai acabar quando a própria sociedade entender o valor e verdadeiro amor que uma criança deve receber”, alerta Salete.

Crianças perdem a infância para o crime

Por Claudemir Schmitz

Anderson começou a usar drogas com apenas 7 anos de idade. Hoje com 16 anos já perdeu as contas de quantas vezes foi preso. Sérgio cometeu um assassinato aos 15 anos de idade. O motivo: acerto de drogas. Tiago, de 16 anos, já cometeu inúmeros assaltos para manter o vício das drogas.

Anderson, Sérgio e Tiago fazem parte de uma geração que cada vez mais assusta o país. Ainda crianças entram para o mundo das drogas, na adolescência iniciam no tráfico. Se não recuperados nessa fase, tornam-se adultos que praticam atos que aterrorizam a sociedade.

No Brasil, em dez anos, o contingente de menores que ingressaram em centros de reabilitação e internatos cresceu quase 400%. São cerca de 60 mil adolescentes que cometeram algum tipo de infração.

A primeira droga que Anderson usou foi a maconha, em seguida a cocaína e com 12 anos tornou-se dependente de crack. “Quando eu vi não consegui mais parar, e logo em seguida entrei no trafico”, relembra o menino. “A droga é mais forte que o cara”, lamenta Anderson.

Hoje cumprindo a medida de semi-liberdade, o adolescente tenta largar o vício e recuperar o tempo perdido. “Briguei com a minha mãe e meus irmãos e agora estou tentando recuperar tudo de novo”, afirma Anderson, que espera ansioso pela visita da mãe.

Sérgio começou a usar drogas com 14 anos, hoje com 16, já utilizou vários tipos de tóxicos. “Maconha, crack, cocaína, injetei na veia, tudo isso eu já fiz”, relata o adolescente. A mãe dele tinha conhecimento de que ele era dependente químico. “A minha mãe falava que a minha cabeça era a minha sentença”, lembra Sérgio. “Eu nunca escondi dela que eu usava drogas. Era melhor ela saber pela minha boca do que pela boca dos outros. Algumas vezes eu fumava maconha sentado no sofá sala”, afirma o adolescente.

Tiago, de 16 anos, antes de ser preso, fumava 10 pedras de crack por dia. O garoto lembra que as más companhias fizeram com que ele entrasse no mundo das drogas. “Os amigos chegam no ouvido do cara convidam para fazer, e com o tempo eles botam aquilo na tua cabeça, quando tu vê já está no meio”, diz Tiago.

Os adolescentes não usam meias palavras quando o assunto é o acesso às drogas, eles afirmam que é muito fácil obter o produto. “Quem é usuário consegue sem grandes dificuldades”, conta Tiago. “Simplesmente é muito tranqüilo conseguir, é mais fácil conseguir a droga do que a libertação da droga”, considera Sérgio.

Como conseguir o dinheiro

Para manter o vício das drogas, os adolescentes começam a cometer uma série de delitos, como assaltos, furtos e roubos. “Estava caminhando pela calçada e observava uma mulher, daí eu me aproximei dela, coloquei a faca no pescoço e puxei a bolsa dela, ainda sem querer cortei os dedos e um pouco do pescoço”, lembra Tiago do primeiro assalto que praticou, quando tinha apenas 13 anos. “Já fiz vários assaltos, era lanchonete, mercado, carro, moto e pessoas que andavam pelas ruas”, conta Sérgio.

Anderson fazia rifas falsas para arranjar o dinheiro. “Saáa pelas ruas vendendo o bilhete, tinha vez que eu conseguia fazer até mil reais”, relata o garoto. Para conseguir êxito na venda, o adolescente tinha um discurso bem apelativo. “Eu falava para as pessoas que era para ajudar a família, e que eu meus irmãos estavá-mos passando fome”, revela Anderson. O jovem também ia nas casas oferecer se as pessoas queriam engraxar o sapato, e enquanto elas pegavam os calçados, Anderson entrava e pegava algum objeto da residência e fugia. “Roubei muito dvd desse jeito. No entanto tinha que ser bastante ágil”, conta o adolescente.

Para o Promotor de Justiça da Vara da Infância e do Adolescente de Araranguá, Leonardo Todeschini, a droga desencadeia uma série de problemas na vida dos jovens. “Hoje a droga é uma questão que na maioria das vezes, está condicionada ao adolescente infrator”, relata o promotor.

Assasinato

Geralmente a primeira infração cometida por um adolescente é o furto ou roubo, mas, segundo especialistas, a sensação de impunidade e as falhas no processo de recuperação desses jovens levam a infrações mais graves, como o assassinato.

Sérgio cometeu um homicídio quando tinha apenas 15. Desentendimentos por causa da droga fizeram com que o jovem cometesse o crime. “Eu tinha escondido meio quilo de crack e meio quilo de maconha, e ele estava olhando onde eu escondi, e daí ele foi lá e roubou, depois eu armei uma tocaia para ele em cima do morro e matei”, afirma o adolescente, que depois ainda foi ao velório da vítima.

Familiares envolvidos

A maioria dos jovens infratores tem algum familiar envolvido com as drogas, tráfico, ou está preso. “Meu pai é um perdido na droga, e tenho sete primos que são traficantes”, relata Sérgio. “O meu pai está preso”, conta Anderson.

Para a psicóloga da casa de semi-liberdade, de Araranguá, Débora Pereia, esse meio da violência e da criminalidade em que os jovens vivem é um fator determinante para que eles entrem no mundo do crime. “Eles nascem num local onde o vizinho da frente é traficante, a vizinha do lado é prostituta, quando não é a própria mãe”, aponta a psicóloga. “O trafico, roubo, a droga e a criminalidade fazem parte do dia-a-dia deles”, acrescenta.

Fugas

As fugas e as idas e vindas aos Centros de Internação Provisória (CIP) e casas de semi-liberdade marcam o currículo de Sérgio, Anderson e Tiago. “Fiquei oito meses foragido”, afirma Sérgio, que nesse tempo morava na casa de amigos e parentes. Já Tiago ficou um ano e três meses. “Durante esse tempo eu morava em casa e quando a polícia aparecia eu fugia”, revela o garoto. Anderson teve 13 fugas. “Quando estava foragido dormia na rodoviária, no mato ou na casa de amigos, muitos dias passei fome”, lembra o jovem.

Armas

Os adolescentes contam que no mundo em que eles viviam a arma é um objeto fundamental. “Eu tinha armas, mas era para a minha proteção, porque eu tinha guerra”, revela Sérgio. “Eu tive um oitão e uma vinte. Comprei elas, pois no mundo em que eu estava eu precisava”, afirma Tiago. Anderson adquiriu armas para praticar assaltos. “Tive uma 32, 38 e 28 (calibre)”, conta o adolescente.

Dificuldades da recuperação

A coordenadora da casa de semi-liberdade, Josiane de Souza, relata que a recuperação de um jovem infrator requer muito trabalho. “O comportamento deles foi construído ao longo da vida, eles nasceram em um meio e a gente quer inserir eles em outro”, avalia a coordenadora. “É um trabalho difícil, e se de cada dez conseguirmos recuperar um já tivemos um grande resultado”, acrescenta Josiane. A psicóloga, da casa, Débora Pereira, analisa que a exclusão da sociedade também dificulta a ressocialização dos adolescentes. “Quando um jovem está quase saindo daqui, procuramos um emprego para ele, e quando damos a referência do adolescente as portas se fecham”, explica a psicóloga.

Solução

Para o promotor Leonardo Todeschini, o investimento na educação seria importante para a recuperação desses adolescentes. “O incremento da educação tanto para os pais quanto para essas crianças, a ocupação educacional de todas as crianças do país, com certeza reduziria e muito o comportamento inadequado dessas crianças”, analisa. Todeschini avalia que a redução penal não seria a melhor saída para a diminuição dos casos de menores infratores. “Uma atitude dessa você só iria mudar o foco, trocando uma iniciativa educacional e social por uma iniciativa de exclusão que é a inclusão dessas pessoas no sistema penitenciário”, relata o promotor.

Planos para o futuro

Tiago tem incerteza quanto ao seu futuro. “Ainda não sei o que eu vou fazer”, diz o garoto. Já Sérgio e Anderson fazem planos para o futuro. “Quando sair daqui quero estudar”, conta Sérgio. Já Anderson quer parar com a vida do tráfico e do assalto. “Vou procurar um serviço decente, e ajudar a minha mãe”, diz o adolescente. Os jovens também se arrependem do que fizeram. “Todo mundo tem”, diz Anderson. “O mundo das drogas é muito cruel, se você tem alguma dívida de droga com alguém, pode ser cinco reais, eles te matam”.


(*Os nomes dos adolescentes apresentados nessa reportagem são fictícios).

Gravidez precoce e seus desafios

Por Fabrine Jeremias

A gravidez precoce está cada vez mais comum na adolescência. Muitos fatores contribuem para isso, tendo como principal o problema socioeconômico e cultural do país, que faz com que os adolescentes iniciem a vida sexual cada vez mais cedo.

Assim aconteceu com Araceli Santa Helena Jeremias Rodrigues, que engravidou aos 15 anos. “Foi um pouco complicado, senti muitos enjôos, o corpo vai mudando. Acredito que as escolas e os sistemas de educação estão muito mais preocupados em dar conta das matérias.” Diante disso temas importantíssimos como sexualidade, gravidez, drogas deixam de ser debatidos. “Hoje nem tanto mas há 15 anos quando eu fiquei grávida com certeza sim.”

Aí chegamos a outro ponto, a menina também não está psicologicamente pronta para construir uma família com seu namorado. A maioria das adolescentes que engravidam são mães solteiras, normalmente os jovens não assumem um compromisso, o que é a causa de muitos abortos.

A forma mais fácil de tentar diminuir o número de gravidez indesejada é o diálogo entre pais, filhos e colégio, que são a parte mais próxima para passar as informações necessárias, evitar esses acontecimentos e também as doenças sexualmente transmissíveis.

A questão é que ainda há muito tabu em relação ao assunto sexo. Os pais ainda se sentem constrangidos para falarem com seus filhos. Essa falta de esclarecimento é o que gera jovens mal instruídos para terem relações sexuais sem uma boa instrução. Teresinha Silveira, que é mãe de uma adolescente de 15 anos, acredita que a conversa é a melhor prevenção, mas que mesmo assim, ninguém está isento de um fato desses.

As vidas dessas meninas acabam se tornando um transtorno e precisam mais do que nunca o apoio da família. Araceli diz que quando descobriu que estava grávida foi muito difícil contar aos seus pais e para o próprio namorado. Diz que apesar de Jorge (pai de seu filho) ter ficado muito assustado, ele aceitou e apoiou todo o tempo.

Já para os pais dela foi mais complicado contar. Ficou sem coragem. Mas depois, junto com o namorado, revelou tudo e a família acolheu o novo fato. Assim a gravidez foi levada normalmente sem grandes transtornos.

Jovens que engravidam normalmente são de famílias que passaram pela mesma situação, gravidez precoce, abandono e mães solteiras, ou seja, elas já se encontram em um ambiente desestruturado e acabam gerando mais desestrutura familiar.

Além da camisinha, o uso de anticoncepcionais é muito raro. A negação do uso é tanto maior quanto menor a faixa etária. E o curioso entre as pesquisas relacionadas a esses assuntos, é que mesmo a facilidade a informações de campanhas, internet, televisão, dentre outros, não tem garantido uma maior prevenção.

É muito importante que este assunto seja levado a sério, não só durante a gravidez, como também para um bom parto e a futura educação e criação dessa nova criança que virá ao mundo.

Preconceito

Um grande obstáculo que os jovens encontram é o preconceito da sociedade, que ainda julga muito estes adolescentes e ajudam a piorar o desenvolvimento da gravidez. Os amigos que se afastam, os próprios pais desses amigos, a falta de preparo das escolas para lidar com esses jovens e a saída do ambiente escolar que, para muitos, não é temporária.

Araceli lembra como foi com ela: “senti preconceito sim, alguns amigos chegaram a se afastar. As mães das amigas também faziam comentários desagradáveis. Inclusive eu mesma com medo do preconceito me afastei de muitas coisas, de ir a lugares, a escola inclusive desisti de freqüentar.”

Não é nada fácil lidar com todas essas novas mudanças e sentimentos que os jovens sofrem quando acontece a gravidez indesejada. Pesquisas mostram também que as taxas de suicídio nas adolescentes grávidas são mais elevadas em relação às não grávidas, principalmente nas jovens solteiras, um dado preocupante.

Pesquisas

No caso do Brasil, uma pesquisa que desde 2001 vem avaliando dados sobre a gravidez na adolescência em três capitais brasileiras, Rio de Janeiro, Salvador e Porto Alegre, traz novos indicativos sobre aspectos dessa questão; Nos últimos vinte anos, houve no Brasil um aumento de fecundidade entre jovens de 15 a 19 anos, segundo os dados da ABRASCO (Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva).

Final feliz

Mas como nem todas as histórias são tristes e traumáticas, Araceli fala que ela é uma exceção. “Como mãe com certeza me surpreendi, me sai muito bem, pelo menos eu acho. Muitas vezes como toda adolescente sendo muito teimosa, eu não queria a opinião de ninguém, mas de um modo geral correu tudo muito bem.” E quando seu filho tinha dois meses já voltou a freqüentar a escola.

A experiência do casamento veio junto com a gravidez. “Eu casei ainda grávida de cinco meses, e até hoje, com quatorze anos de casamento, estou muito feliz com meu marido e meu filho. Com certeza, no meu caso, foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida.”

Crianças trabalhavam como gente grande


Por Lysiê Santos

A sociedade brasileira tem enfrentado nos últimos anos uma de suas piores crises econômicas, políticas e sociais, resultando em um crescente empobrecimento da população e também afetando de forma dramática, crianças e adolescentes.

São 250 milhões de crianças de 5 a 14 anos que trabalham no mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Pelo menos 3,5 milhões estão no Brasil.

Essas crianças, quase sempre, não estudam porque precisam trabalhar. Considera-se criança a pessoas até 12 anos de idade incompletos, e adolescentes aquelas entre 12 e 18 anos de idade, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Leonardo (nome fictício) tem 13 anos e está na 5º série. Mora com o pai, a mãe e mais três irmãos na cidade de Treze de Maio. O menino conta que desde cedo trabalhava na roça para auxiliar os pais. “Eu carpia roça, colhia feijão e também já trabalhei na olaria”.

Muitas vezes, Leonardo já passou fome por ficar o dia inteiro trabalhando e não ter o que levar para comer. Mas não se importava, pois queria ajudar no sustento da casa. Tentava pensar que o trabalho era divertido e assim esquecia a fome e do cansaço.

Após uma denúncia anônima, o Conselho Tutelar descobriu o caso da criança e a encaminhou ao Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI). Este é um projeto de assistência social, que tem o objetivo de contribuir para eliminação de todas as formas de trabalho infantil no país. O programa atende crianças e adolescentes com idade inferior a 16 anos.

Angelina Citadin De Pieri, uma das professoras responsáveis pelo programa, relata que os alunos são retirados de diversas formas de trabalho e são integrados no PETI. No programa, os alunos passam o tempo com diversas atividades supervisionadas e também recebem atendimento médico e odontológico. “Eles gostam muito das brincadeiras e confeccionam brinquedos, fazem artesanato e várias outras atividades”, comenta a professora.

A psicóloga Edlaine Paseto Vitorassi, que atende os alunos, canta que quando a criança sofre algum tipo de violência ou tem uma vida difícil, acaba ficando mais agressiva. Ela começa a colocar sua emoção e angústias em alguma coisa, muitas vezes sendo agressiva com os colegas e com todos que estão a sua volta.

A sociedade em determinadas situações excluem essas crianças por serem de famílias humildes e por frequentarem o programa. “Hoje sabemos que as nossas crianças são rotuladas. Alguns, quando observam os alunos e ficam sabendo que fizeram algo de errado, já ficam receosos e se afastam pro preconceito. Nossas crianças são maravilhosas, mas muito carentes de afeto e atenção”, reflete a psicóloga.

Com intuito de desenvolver a educação, manter as crianças na escola e zelar pelo crescimento sadio, as professoras desenvolvem diversas atividades artísticas, culturais, esportivas e de lazer. A professora Claudia De Pieri ressalta que no PETI trabalham com a dança, o lúdico, a educação física, a arte, a higiene e o apoio pedagógico. “As crianças se destacam muito na dança e até fazemos apresentações em eventos sociais”, diz a professora.

Depois que Leonardo foi integrado ao PETI sua rotina mudou. Hoje em dia, no período matutino, fica no programa e participa das diversas atividades supervisionadas. No período da tarde, vai para a escola e depois retorna para casa. “Assim que eu entrei no PETI tudo mudou pra mim. Eu comecei a estudar, melhorei minhas notas. As professoras me ajudaram bastante. Faço exercícios na educação física, brinco com os meus amigos e a comida é muito boa”, comenta Leonardo.

Os amigos de Leonardo, Edivan de 12 anos e Giovane de 14 anos, relembram que antes de entrarem no programa, trabalhavam com os pais na roça. Algumas vezes, para ganhar dinheiro e auxiliar na renda familiar, os dois trabalhavam com os pais na pedreira até tarde. “A gente sempre ia junto na pedreira com o pai do Giovane, ajudar no trabalho”, conta Edivan.

O Conselho Tutelar também foi acionado e os meninos começaram a participar do programa. “Agora que entrei no PETI ficou muito legal. Fiz vários amigos, melhorei na escola e hoje não trabalho mais só estudo”, diz Giovane.

Programa auxilia famílias

O PETI consiste em um programa de transferência de renda do Governo Federal, sendo executado pelo município, para famílias de crianças e adolescentes envolvidos no trabalho precoce. Dentre os objetivos está à retirada de crianças e adolescentes do trabalho perigoso, possibilitar o acesso, a permanência e o bom desempenho das crianças na escola, enriquecerem o universo informativo, cultural por meio de atividades complementares e articuladas entre si, apoiar a criança e adolescente em seu processo de desenvolvimento, orientar as famílias beneficiadas através de visitas domiciliares e atendimento social através de palestras.

Para cada criança e adolescente inserido no programa, a família recebe uma quantia de R$ 25,00 (vinte e cinco reais). Mas para que a família seja beneficiada, os pais precisam retirar todos os filhos menores de 16 anos de atividades de exploração, mantê-los na faixa etária de 7 a 15 anos na escola, apoiar a manutenção dos filhos nas atividades desenvolvidas pelo PETI, além de participar das atividades sócio educativas e de programas de qualificação profissional e de geração de trabalho e renda oferecidos pelo município.

O resgate da dignidade

Por Fabíola Oliveira

C. de 16 anos cumpre medida sócioeducativa no Centro de Internação Provisória (CIP) de Criciúma, onde aguarda sentença. O adolescente se arrepende do ato criminal, sente dificuldade em cumprir as regras estabelecidas no centro e tem na ponta da língua o que pretende fazer quando ganhar a liberdade “trabalhar e mudar de vida né... Erguer a cabeça”, afirma. Porém, a maior dificuldade encontrada por adolescentes que cometeram algum ato infracional é obter o “perdão da sociedade”.

A pretensão de C. coincide com a da maioria dos adolescentes que cumpre esse tipo de medida. O problema é que ela não é fácil de ser alcançada. Segundo a coordenadora do CIP de Criciúma, Iza Maria do Rosário de Andrade, grande parte dos 20 internos do centro é reincidente. Apesar da vontade de mudar de vida, quando saem do CIP esses adolescentes acabam cometendo o mesmo erro. Isso porque se deparam com os problemas que tinham antes, somados à discriminação e à resistência por parte da sociedade.

Até mesmo contra a própria instituição, a resistência é demonstrada. Os moradores do bairro Vila Zuleima, em Criciúma, onde o CIP está instalado atualmente, já expressaram o desejo de retirar a instituição do local. Para Iza, que convida a comunidade a visitar e conhecer o centro, essa discriminação é um dos motivos que dificulta a recuperação dos internos.

Criar políticas públicas para auxiliar os adolescentes que acabaram de cumprir a medida sócioeducativa é uma das possíveis soluções apontadas por Iza, que afirma que a culpa não pode ser colocada apenas na família, no poder público ou na comunidade. “É uma rede de atendimento, se essa rede trabalhar em prol disso a gente consegue”, diz. Para ela, depois que o jovem entra para o mundo do crime, é obrigação de todos ajudá-lo a sair.

Medidas Desenvolvidas

Conforme dados do IBGE de 2006, 34. 876 adolescentes brasileiros cumpriam algum tipo de medida sócioeducativa em todo país. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê três formas de cumprimento das medidas: o meio aberto, que consiste em prestação de serviços comunitários; o meio fechado, que é a internação ou internação provisória; e o regime de semi-liberdade.

A internação provisória é efetuada em flagrante do ato infracional, ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária, sendo que o internamento não pode ultrapassar 45 dias, prazo em que deve sair a sentença do adolescente. No CIP, são desenvolvidas medidas sócioeducativas que visam trabalhar com o potencial dos adolescentes em conflito com a lei.
Em Criciúma, são realizadas, além do ensino fundamental e médio, aulas de música. O projeto Comunicasom é uma iniciativa da Justiça Federal em parceria com o músico Eduardo Ferreira. No projeto, os internos realizam trabalhos com música, rádio, informática e poesia, que podem ser conferidos no blog Projeto Comunicasom .

Um dano irreversível

De acordo com o ECA, o Conselho Tutelar é o órgão encarregado pela sociedade para zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. Toda vez que os direitos dos menores forem desrespeitados, o conselho deve intervir e fazer com que a lei seja cumprida. Segundo o presidente do Conselho Tutelar de Tubarão, Fernando Fernandes Antunes, na maioria dos casos, o principal motivo que leva um adulto a cometer crimes contra crianças e adolescentes é o contato com o mundo das drogas.

Isso não é mera coincidência. A coordenadora do CIP de Criciúma também aponta as drogas como o principal motivo que leva os adolescentes a cometerem crimes e a persistirem neles. A facilidade da oferta e os benefícios financeiros obtidos com o tráfico são chamarizes que atraem cada vez mais pessoas para o mundo das drogas. Um mundo onde os principais prejudicados são aqueles que serão os responsáveis pela construção do tão esperado “futuro do país”.

Programa beneficia crianças em Imbituba.

Por Anny Caroline

A aluna Érika Lazarim, de 12 anos, foi inserida no Programa de erradicação do Trabalho Infantil há mais de cinco anos e toca bateria na oficina de música há três anos. Ela diz que se não estivesse participando da Oficina de música, estaria em outra oficina. É muito difícil conversar com as crianças sobre seus problemas, pois para estarem ali, imagina-se o que passaram.
Ao entrar na oficina, observam-se diversas crianças com seus instrumentos musicais e outras apenas admirando e sonhando em tocar um dia.

“Eu sempre digo na minha casa, que meu trabalho com a oficina de música do PETI é unir o útil ao agradável. Eu amo música, adoro criança e estar aqui com eles é um prazer”, Diz o professor de música Jean Nunes.

“Ano passado ganhamos um prêmio da CDL. Isso é muito satisfatório para mim e para eles, nos motiva ainda mais a continuar esse trabalho”, acrescentou.

Jean Nunes é professor de Artes no Colégio Estadual Engenheiro Álvaro Catão e conta que muitas crianças de lá migraram para o PETI com o objetivo de aprender música.
Há diversos professores em diversas oficinas, mas para quem visita o programa, é emocionante ver aquelas crianças envolvidas com teatro, música, dança e artes cênicas em geral. O sentimento transborda de tal forma que para alguns é impossível conter algumas lágrimas.

O PETI foi implantado na cidade de Imbituba há mais de 10 anos. Tem uma função social, educativa e afasta crianças e adolescentes do trabalho precoce, viabilizando novas oportunidades para quem perderia sua infância. Uma verba de R$25,00 é destinada à família que cadastra a criança ou adolescente no programa.
Viver a infância é um direito de todo ser humano, atribuído por lei.
Há diversas situações que levam a criança a se cadastrar no PETI e em programas relacionados à proteção da criança e do adolescente. Pode ser através da identificação de situação de trabalho infantil ou o envolvimento de adolescentes com drogas. Os professores precisam estar preparados para o que der e vier e ter capacidade suficiente para provar que estar ali é bem melhor.

“Ser coordenadora de programas como o PETI é muito satisfatório. Olhando o problema dessas crianças, esquecemos os nossos. Aliás, os nossos problemas não existem perto do que elas passam”, diz Maria Eliete Pereira, coordenadora do projeto há cinco anos.

O programa está inserido em um processo de resgate a cidadania e promoção de direitos de seus usuários, bem como de inclusão social de suas famílias cadastradas.

“O PETI atende famílias com crianças retiradas de diversas situações de trabalho, com menos de 16 anos. As crianças cadastradas aqui em Imbituba chegam pelo Conselho Tutelar. Mas às vezes, chegam por intermédio de vizinhos, coleguinhas, que identificam a situação de trabalho”, Afirma Eliete Pereira.
O programa está disponibilizado a todos os municípios, por meio da identificação das situações de trabalho infantil, cabendo à Secretaria Municipal de Assistência Social realizar o cadastramento das famílias. Combater o trabalho infantil vem sendo um grande desafio.

“Falar de algum caso que o PETI resolveu é impossível, na verdade são muitos casos. Um às vezes se interliga ao outro”, relata Eliete Pereira.

Ela fala também sobre casos de adolescentes que viviam nas ruas e se envolviam com drogas. Eliete conta a história de uma menina que foi atendida pelo programa PETI.

“Nós observamos que ela estava sempre desanimada para fazer as atividades, sempre com a cabeça baixa, não interagia muito bem com os outros coleguinhas”. E conta como o problema foi solucionado.

“Através de crianças que eram vizinhas e conheciam a menina, descobrimos que ela acordava de madrugada para catar reciclável com a mãe. Entramos em ação, conversamos com a mãe da criança e hoje ela é outra menina”, diz Eliete Pereira.
O PETI integra oficinas de padaria, cabeleireiro, maquiagem e beleza em geral, manicure, marcenaria, artesanato, dança teatro, aulas de reforço, recreação e música.

O desafio de combater o trabalho infantil conta com diversos fatores estratégicos, dois deles são a capacitação e o amor dos profissionais.